Denis Zuliano é dono da Classic Metal Records, gravadora especializada em heavy metal anos 1980 sediada em Ilhabela (SP). Conversei com ele sobre histórias do selo, lançamentos marcantes e também sobre dica para artistas que desejam prosperar nesse mercado. Boa leitura!
Como surgiu a ideia de começar a Classic Metal Records?
Comecei como um vendedor normal de CD pela internet. O início foi no Orkut, depois migrei para o Facebook. Fui criando clientela. Em meados de 2013, tive a ideia de montar a Classic Metal Records. Sou colecionador de metal anos 1980 – adoro new wave of british heavy metal. Sempre vi dificuldade para encontrar esses materiais no Brasil. Quando achava, era caro para caramba e só importado.
Pensei em montar uma gravadora para lançar essas raridades. No começo, fiz parcerias, porque era leigo no assunto. Lançamos coisas da Harpia em parceria com um selo português. Fiz contato com as bandas da NWOBHM e conseguimos lançar Witchfinder, Chateaux e outras. O som é bem agradável, na pegada do heavy tradicional. Foi dando certo porque o público era carente desses lançamentos. Todos se empolgaram.
Hoje, vejo que outras gravadoras do Brasil conseguiram o que conseguimos – lançando coisas típicas dos anos 1980. Antigamente, o pessoal era carente. Hoje, tem gente que pede por favor para lançar aos poucos, porque não conseguem acompanhar! [risos].
Quais são os principais desafios de começar uma gravadora de metal no Brasil?
Primeiro, você precisa ter a consciência que está trabalhando no underground. Não vai montar um selo de metal e ficar milionário. Isso é um desafio já. Outra coisa que percebo é que antes da pandemia os gringos não queriam sair no Brasil. Não deixavam os CDs virem para cá. Era uma dificuldade conseguir a confiança deles para que eles liberassem o lançamento aqui. O Brasil não tem fama muito boa lá fora! [risos]. Os produtores gringos não querem fabricar coisas aqui.
Isso acontece ainda. Já fiz propostas gigantes e os caras simplesmente dizem que não vão lançar aqui e ponto final. Ainda acontece, mas agora sinto o mercado um pouco mais liberal nesse sentido. A pandemia afetou muito, eles sentiram no bolso e começaram a liberar. É engraçado isso.
Vocês pretendem começar a vender em loja física?
Por enquanto, o estoque fica aqui em Ilhabela (SP). Minha terra natal, sou caiçara. Despachamos daqui. O pessoal pergunta se pretendo montar loja em São Paulo, mas não sei. Se montar, para controlar o estoque seria cruel. Temos itens caros que são tipo uma unidade só. Se vendo na loja física, teria que abater o estoque virtual. Isso seria complicado, não estou encarando ainda.
Os fãs de metal são conhecidos por gostar das bandas antigas e não serem muito receptivos ao novo. Você sente isso na gravadora?
Tenho essa visão e meus clientes também. O que me fez dar um passo adiante na gravadora foram as bandas antigas e não as novas. Sempre bato o martelo nas antigas. Hoje em dia, dou força para as novas. Tenho assédio de artistas novos, mas preciso negar vários. Seleciono alguns. Lancei agora o Marenna e o Alex Meister. Acho importante ajudar a nova geração. Elas têm uma importância muito grande para a cena. Às vezes, digo para as bandas que mandei CDs para o Japão ou algum lugar do tipo e os caras ficam felizes demais! Esse trabalho que a Classic Metal faz é importante!
Quais os principais pontos que envolvem uma negociação para lançar um disco de um artista lá de fora aqui no Brasil?
Tudo é um processo. Tem a parte contratual e se você cumprir tudo dará tudo certo. É preciso muito respeito também. Sempre trabalho em cima de royalties. Pago para todos os músicos, até para as bandas do Brasil. Existem gravadoras que não pagam, mas sempre faço questão. Esse respeito com o músico é muito importante.
É desafiador esse ponto, porque é algo pessoal. Tem músico que fala: ‘Mas você quer meu CPF para quê?’. É para registrar a música no nome deles! Tem que explicar tudo e é uma burocracia até chegar no material físico.
Como você analisa a competição com os streamings como Spotify? Tem espaço para todo mundo?
Acho que o streaming veio para agregar. O problema era quando o MP3 era ilegal. Esse era um grande problema e ajudou a cair as vendas. O Spotify ajuda a cair as vendas dos álbuns físicos também, mas é uma plataforma que paga os músicos e a gravadora. Não é ilegal. É uma coisa séria que te dá retorno. O problema era a ilegalidade de antes. A pessoa fazia mil downloads de uma música e nós não recebíamos nada. Você não vai ganhar nem R$ 1 mil por ano lá, mas é alguma coisa.
A venda de CDs hoje em dia contribui muito para a renda de um artista hoje em dia ou os shows captam mais dinheiro?
O CD faz parte da renda sim. Agora, tem músico que é desacreditado na questão dos CDs. Falam: ‘Nunca vou fazer porque ninguém mais compra’. Eu explico que o álbum físico sempre vai ser o cartão de visita do músico. Não adianta. Você não vai andar com dez pen drives no bolso e distribuir para as pessoas. Acho que é por aí. Claro que a banda ganha mais com o show, mas você pode entregar seu CD para algum parceiro e dali começa algo. Quando a banda chega com um disco gravado, isso muda a percepção. Se você entrega o CD, já muda tudo.
Qual foi o disco da Classic Metal Records que você não botava muita fé, mas acabou vendendo muito?
Esses álbuns de metal dos anos 1980 sempre dão certo. O que lancei e não deu certo foi mais porque decidi fabricar muitas cópias. Fiz 1 mil e deveria ter feito quinhentas. Daí, desovo apenas metade. Os discos do Cloven Hoof eu fechei 1 mil e era para ter fechado menos com a banda. Normalmente, não encalham. Nesse caso, os discos saíram na Europa também. Era mais para o público daqui.
Quais são os atuais grandes campeões de venda?
Atualmente, com certeza é o álbum ‘Prisioneiro do Rock 'N' Roll’, da banda Trovão. Fiquei impressionado. Um amigo meu me mostrou e disse que eles tinham pegada anos 1980. Eu escutei e quis saber quem era. Peguei o contato do Gustavo, que é do Selvageria também. Falei para lançar o disco. Em um mês, acabaram 500 cópias! Para uma banda brasileira, isso é ótimo! Foi a banda com mais repercussão recente.
Outro caso emblemático foi quando lançamos o Troyen, da new wave of british heavy metal. Nunca tinha saído nada deles aqui no Brasil. Eles são dos anos 1980. Vi o show deles na Europa, falei para lançar no Brasil e vendeu muito! As 500 cópias saíram em 5 meses. Esse é um trabalho legal que a Classic Metal faz de resgatar o metal dos anos 1980.
Quais os artistas que você mais sonha em lançar?
Tem vários! Por exemplo, esses tempos atrás, estava falando com o Angel Witch. Queria lançar os discos antigos, mas o álbum é todo blindado com gravadora antiga. Você não acha quem é o detentor dos direitos e nem a própria banda sabe! De qualquer forma, eles são um sonho. Outra meta é o Running Wild. Seria ótimo lançar os clássicos deles por aqui. O Tokyo Blade era um sonho também, mas esse conseguimos! Foi um disco duplo!
E qual o artista que você mais se orgulha de ter lançado?
Tem o Quartz que foi muito gratificante de ter lançado. Consegui os primeiros da banda, mas também lancei o novo deles. O mais legal é que a banda ficou amiga nossa! [risos]. Eles são tudo gente boa. Uns senhorzinhos, sabe? Eles viveram a história do rock e do metal na Inglaterra e hoje são amigos nossos. Isso é muito legal! Tem até vídeo deles falando sobre a Classic Metal Records no YouTube. Nunca esqueço de conversar com eles na Europa. Eles contando histórias sobre o Ozzy Osbourne e as turnês que fizeram juntos.
Quais são os formatos de CD que o pessoal mais gosta? Slipcase?
O que nunca dá errado é o clássico acrílico. Agora, o digipack é o favorito de muitos colecionadores. Se você izer o acrílico, todos compram. O problem é que algumas pessoas rejeitam o digipack. Como vendedor, tenho esse ponto de vista. Tem edições que prefiro fazer em ambos os formatos. Faço 500 de cara, por exemplo. Aí agrado todo mundo.
Tem muitas bandas novas que te procuram. Qual conselho você dá para elas prosperarem?
Acho que o artista precisa começar tendo humildade. Tem muitos que se acham bom para caramba, mas não são humildes. Dificilmente eles vão para frente. Tem que ser humilde, falar com todos e não achar que é estrela. Isso é até feio, sabe? Eu lido com artistas de todos os jeitos. Já lidei com pessoas nojentas. É horrível isso. O caminho do sucesso passa pela humildade. É meu conselho principal.
Como você avalia o futuro do metal? Para onde as bandas estão apontando mais?
Eu vejo que a aposta no melódico tem mais chance de fazer sucesso mundial mais rápido. As bandas que fazem sucesso como Helloween e Angra estão aí para provar isso. O Sepultura chegou com outro estilo, mas foi um achado! É difícil chegar. O melódico tem mais chance do que o tradicional, mas depende muito da criatividade do músico. O Trovão, por exemplo, fez riffs que marcaram.