31/08/2022 às 18:38 Entrevistas

Entrevista: Hansi Kürsch (Blind Guardian)

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8min de leitura

Não dá para imaginar a história do power metal sem a voz potente de Hansi Kürsch e as músicas fantásticas e épicas do Blind Guardian.

Ao mesmo tempo em que comemoram 30 anos do clássico “Somewhere Far Beyond”, os bardos alemães lançam, pela Nuclear Blast, o novo álbum “The God Machine”.

Conversei com Hansi sobre as inspirações para o novo disco – que vão de The Witcher até a morte de sua mãe – e abordamos também histórias da magnífica carreira do Blind. Boa leitura!

Como está sendo a experiência de retornar aos grandes shows e festivais depois da pandemia? E a reação às músicas novas que vocês já estão tocando?

Não estamos tocando muitas músicas novas ainda. Na época, em 2021, tocamos a “Deliver Us From Evil” e “Violent Shadows”. Agora, nos festivais, estamos focando nos clássicos e no álbum “Somewhere Far Beyond", que completa 30 anos de lançamento.

Essas músicas novas foram muito divertidas de tocar! Elas são mais difíceis e exigem mais do que “Ashes To Ashes”, por exemplo. Acho que elas vão soar bem ao vivo, sabe? Quando começarmos a tocar para valer em 2023, muitas músicas do novo álbum “The God Machine” certamente estarão no setlist. Agora a ideia é focar no “Somewhere Far Beyond”. Me sinto muito feliz nos shows, sempre. Sinto que eles se divertem”.

O novo álbum é mais focado no thrash metal, sem muitas orquestrações. Algo típico do começo da carreira do Blind Guardian. Como foi retornar para esse estilo mais “cru”?

Eu concordo com isso! Tem menos orquestra e vai para uma direção mais thrash metal. Se você me pedir para ranquear, diria que “Imaginations From The Other Side” e “Follow The Blind” apresentam a mesma intensidade desse.

“The God Machine” vai totalmente de encontro com os discos que fizemos no começo da carreira. Porém, em termos de composição, não teve muita diferença. Já encontramos uma direção. Não queria fazer algo orquestrado de novo igual “Legacy of the Dark Lands”.

Nessa ocasião, queria me livrar do peso de 25 anos de promessa de trabalhar em um álbum orquestrado. Fiquei feliz com o resultado, mas não queria seguir nessa direção de novo. Discutimos isso dentro da banda e todos sentiram que era por aí mesmo.

Decidimos abordar novos territórios e assim focamos em outros aspectos. Compor é algo natural, não dá para programar, sabe? Precisa ser algo interno. Foi algo bem intenso. Decidimos focar em nós quatro da banda, entende? O que vier além disso, seria um extra. Esse foi o direcionamento. O resultado foi algo natural.

A única música que eu intencionalmente ditei um caminho para a composição foi “Violent Shadows”. Eu queria uma música rápida! Queria uma música que fosse fácil de ouvir. O André Olbrich chegou com uma ideia, depois pensei nos vocais. Foi tudo bem rápido! Não pensamos muito, por isso ficou tão orgânico.

O Blind Guardian é famoso por letras inspiradas em literatura e fantasia. Já “The God Machine” aborda outros temas, como a morte de sua mãe. Como foi tocar nesses assuntos diferentes?

Sim, isso aconteceu memo. É algo que não foi discutido muito internamente. Sempre existe narrativas nas nossas músicas que são de certa forma relacionadas com coisas mais pessoais. No caso de “Ashes To Ashes”, por exemplo, o assunto é a morte do meu pai.

Foi a maneira que encontrei para contar a história. Agora, em “Let It Be No More”, compusemos na época em que minha mãe faleceu. Claro que isso impactou minha performance vocal. Mantive as letras nessa direção. É sobre perda e como isso impacta os que permanecem aqui. É algo mais filosófico.

Qual a diferença entre escrever uma música mais pessoal e inspirada em livros e fantasia?

Vem da mesma fonte, sabe? Porque sempre que busco inspiração de uma história específica, são minhas reflexões. Não é como se eu recontasse a história, entendeu? Eu até fiz isso nos primeiros álbuns, mas desde o “Imaginations From The Other Side”, mudei essa abordagem na hora de escrever as letras.

Eu me valho de autores como Tolkien ou The Witcher, como no último álbum. Aí passo a me relacionar com a história e encontrar um caminho que se relacione com os personagens e tudo mais, mas também trago aspectos sobre o que essa história significa para mim. Mais do que a história em si.

Tenho minha interpretação, sabe? Encontro algumas ligações que possam se relacionar com minha vida ou com alguma filosofia que estou buscando. Você consegue achar essas ligações com os livros, mas se eu não te falar, ninguém saberia sobre o que estou cantando. No caso de “American Gods”, tem a história do Neil Gaiman, que é a inspiração para a música, mas tenho certeza que se eu retirasse esse termo da letra, ninguém saberia que é sobre isso! Ou seja, sempre é algo pessoal.

A música nova “Blood of the Elves” é inspirada em The Witcher. Qual sua relação com a saga? Assistiu a série, jogou os jogos ou leu os livros?

Eu vi só 1 minuto da série de televisão! Agora, o André e o Marcus Siepen amam jogar esse jogo! Eu não sou muito de jogar, então não posso te dizer se é bom ou não. Mas sei que tem um baita sucesso! Eles dois me falaram sobre esse lance do The Witcher, disseram que pode ser algo que gostaria de me aprofundar, que poderia ser um assunto para o próximo álbum.

Então, fiz minha pesquisa. Gosto dessa pegada de literatura clássica. O Andrzej Sapkowski, que escreveu a série, é muito bom. Ao invés de jogar, resolvi ler os livros. De novo, pensei uma abordagem. A música ficou inspirada no Geralt em si, mas em outros personagens também.

Você abordou vários autores como Neil Gaiman e Andrzej no novo álbum. Existe algum artista ou livro que você já tentou fazer uma música sobre, mas a inspiração certa não veio ainda?

Tem uma história triste sobre isso! Durante o processo de composição do “The God Machine”, tinha uma música que resolvemos não incluir. Ela tem outro espírito e não encaixou. Mantivemos para outra ocasião. Se chama “Tribal of Fire”, sobre o autor Miguel de Cervantes. É como uma biografia dele, mas inspirado no Dom Quixote, claro.

Acho que é uma das letras mais legais que escrevi, mas no final decidimos que a música não se encaixaria. Deixamos quieto e será lançado um dia. Para os falantes de espanhol, será um alívio, já que eles estão aguardando muito tempo por uma música nossa sobre um autor espanhol. É uma música mais progressiva e midtempo. Já está até mixada e masterizada.

Como foi a história de que vocês quase compuseram a trilha sonora dos filmes do “Senhor dos Anéis”?

Sim! Nós tentamos! Acabou que não rolou. Lá atrás, rolou um reboliço na internet sobre qual banda ou músico deveria compor a música para os filmes. Era no final dos anos 1990, muitas pessoas votaram no Blind Guardian! Achamos que poderia ser nossa porta de entrada para compor trilhas sonoras para filmes.

Contatamos os produtores, mas eles estavam já finalizando tudo. No final, seria algo muito grande para a gente. Eles estavam dispostos a ouvir nossa música. Nos deram um prazo, mas não conseguiríamos cumprir. Então, nem enviamos nada e a história terminou aí. Houve um pequeno contato, uma chance mínima, mas não daria tempo.

Falando sobre o “Somewhere Far Beyond”, lá se encontra a música do Blind Guardian com maior número de streamings: “The Bard Song: In the Forest”. Quais memórias você tem da composição desse hit?

Esse disco foi um marco para a gente. Foi a primeira vez que visitamos o Japão e nos tornamos número 1 em vários países, como Japão e Grécia. É um dos álbuns mais importantes que fizemos. Ele é a conexão definitiva do Blind Guardian com esse lance de RPG. Somos os Bardos, que vamos nos reunir em algum lugar distante. Esse é o conceito do álbum.

A música “The Bard Song” foi praticamente uma composição minha. Ela fala um pouco sobre o “The Hobbit” mais para o final da letra. Escrevi essa música na época que meu pai estava morrendo. Foi em um dia quando visitava um castelo na vila onde eu morava. Eu fui lá com meu priminho e estava mostrando o local para ele. Fiquei impressionado com o castelo, não visitava já tinha muito tempo. Eu estava matando o tempo, sabe? Era uma época bem triste.

Aí fui para o estúdio e gravei uma primeira versão. Mostrei para o André, ele assumiu e terminamos a música juntos. Ela é a música mais importante da história do Blind Guardian. Acho que a tríade é “Mirror Mirror”, “The Bard Song” e “Valhalla”. São as três mais icônicas. Sempre que tocamos elas, dá certo! Mesmo que as pessoas não conheçam nosso trabalho, a noite fica bacana! Sou grato por esse disco por isso.

Existem várias baladas famosas na carreira do Blind Guardian. Qual o segredo para compor uma boa balada?

No caso de “Nightfall”, é diferente, porque ainda tem uma pegada épica, com vários elementos presentes. Mas no caso de baladas mais normais, elas surgem de maneira espontânea. Você precisa ser honesto na hora de compor e cantar. Tudo é possível.

Tivemos uma sensação acertada quando fizemos “Lord of the Rings” e “The Bard Song”. A que mais achei legal foi a “A Past and Future Secret”, mas dessas é a menos favorita do pessoal. O que é preciso é o momento certo. Agora, com “Let It Be No More”, continua sendo uma balada, mas uma abordagem de atmosfera bem diferente.

Essas anteriores que disse, de alguma forma conseguimos combinar música folclórica irlandesa com um sentimento medieval. Todos relacionam com isso. É nossa forma de compor, que deixou especial. Foi nossa interpretação. Não tem receita, sabe?

Como é o processo de gravação da sua voz para os discos do Blind Guardian? É interessante porque soa como se fossem camadas.

É basicamente uma voz, mas criamos harmonias. É diferente de como fizemos antes, nos discos anteriores. O André surge com tantas ideias de orquestrações que penso que uma voz apenas não seria suficiente! Então, adiciono uma segunda voz, terceira... E por aí vai! É assim que me sinto confortável. A voz não fica perdida.

Às vezes, tem muita informação instrumental e a voz não consegue competir. As pessoas gostam dessa forma que fazemos. Depois que você compreende seu processo de gravação, passa a fazer de forma que seja o melhor possível. Preciso repetir a gravação em certos momentos. Quando tenho uma ideia, vou ao estúdio e tento reproduzir isso da melhor forma.

Você não é muito ativo no Instagram. Acha que é tipo perda de tempo? Como você avalia as redes sociais?

Sou de boas com isso. Não curto muito, verdade. Às vezes, respondo um post ou outro no Facebook sobre o Blind Guardian. Eu aceito que o desenvolvimento das coisas está indo para essa direção. Não tem nada de errado com isso. No Facebook, conseguimos alcançar muitas pessoas. Seria impossível com outra mídia. Existem restrições nos países e tudo mais. A internet é uma benção! Não sempre!

Desde que exista uma pessoa na nossa equipe que esteja atenta nas nossas páginas, isso é importante. Temos controle sobre isso, isso é importante. Acho que 95% das coisas que acontecem com o Blind Guardian na internet nós temos controle. Tem um sentimento de segurança aí.

Deixe uma mensagem para seus fãs no Brasil!

A espera acabou! O novo álbum “The God Machine” está saindo e vocês devem dar uma chance! Quem sabe comprar! Estamos vendo como fazer uma turnê também em 2023. Espero que o mundo fique nesse caminho de melhorias. Vamos nos ver em breve, sou otimista!


31 Ago 2022

Entrevista: Hansi Kürsch (Blind Guardian)

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