26/01/2021 às 22:00 Entrevistas

Entrevista com Alberto Kury: “Tivemos conversas para o Andre Matos entrar no Aquaria!”

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A tradicional banda de Power Metal carioca AQUARIA lançou o terceiro disco da carreira – ALETHEA – que encerra a trilogia iniciada lá atrás com LUXAETERNA e SHAMBALA. Eu conversei com o tecladista  da banda , ALBERTO KURY, e ele falou sobre a história por trás do disco e também sobre o cenário do Power Metal atual!

No bate papo, ele também lembrou os tempos de cover de Beatles, a formação do projeto paralelo NovaLotus e revelou que ANDRE MATOS quase entrou para o Aquaria! Confira abaixo!

Gustavo Maiato: O novo álbum ALETHEA fecha a trilogia que iniciou com o LUXAETERNA (2005) e depois com o SHAMBALA (2007). Desde sempre a ideia era fazer uma trilogia?

Alberto Kury: Desde a época do Shambala a previsão era compor três discos. A ideia era que esse terceiro álbum se passasse no futuro. O Luxaeterna se passa na pré-história ou na pré-matéria. É um disco sobre o passado. O Shambala seria o disco do presente, mais focado em questões humanas. E esse agora é um disco que se passa no futuro.

Tem uma mobilização intertemporal e interdimensional para salvar o planeta do fim do mundo. Isso acontece em um futuro muito distante. Tem essa cronologia. Isso iniciou lá no Shambala.

Gustavo Maiato: Como foi a composição para esse disco? A quarentena influenciou?

Alberto Kury: Voltamos a ativa no final de 2017 com um single de Natal. Lançamos sem pretensão e a resposta foi muito boa. Ficamos confiantes com o feedback e começamos a produzir o que seria o novo disco. Isso foi em 2018. Tinha músicas já prontas, então repensamos muitas coisas. Em 2019, começamos a gravar. No finalzinho da gravação, veio a pandemia.

No começo ficamos apavorados, mas nos adaptamos. Finalizamos tudo de maneira remota. Gravamos e enviamos para o Eduardo Belchior, que fez a mixagem lá na Suécia com a produtora Intensive Music Production. Ele tocou comigo no NovaLotus. Foi assim, na garra! Finalizamos o disco e está aí!

Gustavo Maiato: Conta para a gente um pouco sobre essa história que é contada no disco? Tem viagem no tempo e tudo...

Alberto Kury: A história se passa em um futuro distante. A protagonista é a grande deidade do universo que regula a história, chamada Madeleine. Ela era a Gaia no Luxaeterna, uma imagem feminina. Já no Shambala, ela era a Iara, ela se personificou em uma índia no Brasil. Agora, a reencarnação é a Madeleine, ela está vagando pelo espaço comandando tudo.

Na história, a Terra acaba, ela perde o controle da situação e todos nós somos absorvidos por um grande mal. Na primeira música do disco vemos uma figura como se fosse o diabo. Ele diz que tudo está tomado e que o caos vai reinar. No desespero, ela começa a se comunicar com suas próprias reencarnações em tempos passados.

Ela faz essa comunicação com cartas de tarô holográficas. Ela manda mensagem através de palavras que viajam no tempo e no espaço e encontram essas reencarnações. Só que isso não dá muito certo. Tem muito poder envolvido. A coisa começa a colapsar, ela perde a comunicação com ela mesma.

Nas músicas iniciais, cada uma apresenta um personagem próprio que ela tenta se comunicar. Essa mobilização astral não dá muito certo, mas ela descobre um viajante no tempo. Esse indivíduo tem esse poder, mas não o exerce. Então ela o convence de usar o poder, eles começam a viajar no tempo para organizar as lideranças.

Só que essas viagens no tempo também começam a colapsar. Acontece uma grande tragédia que vai se resolvendo aos poucos! Aí depois tem um final...

Gustavo Maiato: Esse tema da viagem no tempo é bastante explorado em filmes de ficção científica. Em alguns cenários é possível voltar no tempo e mudar o que aconteceu. Em outros, é como se tudo estivesse definido. Mesmo que você volte no tempo e mude algo, o presente continua intacto. Como é a sua visão sobre essa questão da viagem no tempo? Dá para mudar o passado?

Alberto Kury: Eu acredito em uma viagem no tempo mais poética. Entendo que existe a teoria da relatividade de Einstein que diz que o tempo é relativo e existem universos que correm em paralelo. Acredito em uma relação com o tempo mais poética. Quando você lê um livro do passado, você faz uma viagem ao passado. Não que vá mudar a rota, mas você faz essa viagem.

Quando você acessa uma memória sua, é uma forma de viagem também. Não é de forma absoluta. A experiência que temos com o tempo é relativa também. Quando você está em uma ópera do Wagner, fica quatro horas assistindo compenetrado. Você não sente esse tempo passar. Quando você está maratonando uma série na Netflix, você fica horas ali. Aquilo está bem amarrado e te prende.

O contrário também existe: quando é uma atividade que não é prazerosa, o tempo demora mais. Essa experiência então de presente, futuro e passado acontece o tempo todo com a gente. Quando não estamos bem no presente, começamos a projetar o futuro. De certa forma, é uma viagem também. A saudade é uma viagem para o passado. O disco fala sobre isso. Tem essa questão envolvida.

Gustavo Maiato: Uma das músicas mais bacanas do disco é a “THE QUEST”. Ela tem uma introdução de piano muito bonita. Qual foi a inspiração para essa música específica?

Alberto Kury: Ela tem dois temas fortes. O primeiro tema que aparece e o do refrão. Essa música é muito desoladora. A personagem começa a ter consciência de que suas tentativas de salvar a Terra estão dando errado. No final tem uma voz que diz que existem sons que não estão sendo compreendidos nessa viagem pelo tempo.

É um lamento. Talvez essa música seja a que tem os temas mais bem desenvolvidos. Sempre colocamos vários temas, fica uma loucura em termos estruturais, mas nessa ficou algo amarrado.

Gustavo Maiato: Como é o processo de composição, todos escrevem? Depende da música? É todo mundo junto?

Alberto Kury: Depende da música. Na TIME WON´T WAIT o Vitor Veiga (vocalista) trouxe tudo pronto. A voz e a letra, é a visão dele. Tem canções que são todas minhas. Esse disco por acaso tem mais músicas minhas. A THE TIME TRAVELER - que é incrível - é do Vitor e do Luciano de Souza (guitarrista).

Tem músicas da época do Novalotus que foram regravadas. Mas normalmente fazemos juntos os arranjos.

Gustavo Maiato: Vocês lançaram três singles. Como você enxerga essa questão do mercado que exige o lançamento de vários singles...

Alberto Kury: Realmente mudou muita coisa. Antigamente tinha os compactos que eram singles. Funcionavam como música de trabalho. Tinha dois lados, um era mais de trabalho e outro mais artístico, para contrapor.

Depois veio o LP, os Beatles consolidaram isso. Os Beach Boys também. Nos anos 60 veio esse disco mais conceito com o Frank Zappa. As músicas se relacionam, juntas têm uma unidade. Isso virou o paradigma até a internet. Agora, o disco sumiu um pouco. Veio o IPod e tudo mais.

Agora o formato do single está muito forte. Se analisarmos com um olhar mercadológico, os singles movimentam o streaming, que acabou virando uma rede social. As pessoas trocam playlists, tem número de ouvintes. As bandas ficam lançando singles aos poucos. Fizemos assim também, temos que nos adaptar. Eu particularmente adoro discos! Gosto de ver as letras que se comunicam e tudo mais.

Gustavo Maiato: A música com maior número de streamings do Aquaria no Spotify é a AND LET THE SHOW BEGINS. A que você atribui o sucesso dessa música?

Alberto Kury: Essa música foi composta lá em 1998, no calor do Power Metal! É isso que responde. Foi a época do auge do gênero. Eu estava ouvindo muito Stratovarius, primeira fase do Angra, Helloween. Ali tem uma potência disso. Eu era muito fã nessa época. Ela tem um pouco de progressivo também. É longa e vai se desenvolvendo. Ela tem essa energia dos anos 90, mais direta. Mas também um pouco do Power mais sinfônico dos anos 00 que viria mais forte com o Rhapsody.

Gustavo Maiato: Por falar em Power Metal, muita gente hoje em dia acaba dizendo que ouvia muito o estilo na adolescência e agora não ouve mais. Como se a música fosse uma evolução. Como você encara esse pensamento?

Alberto Kury: Esse negócio de gênero é complicado. Às vezes o tempo passa e um gênero volta para a moda. Ele é atualizado, mas a gênese está lá. Se você pensar no Power Metal europeu dos anos 90 e 00, os elementos são os mesmos do Iron Maiden ou Judas Priest. O que é o Power? São vocais agudos e dramáticos, solos e batera rápida. Você tem uma evolução técnica, mas isso não é o mais importante. O importante é o poético.

As emoções e o sentimento estão aí. O Power continuou, modificou com a tecnologia que permite explorar outras questões. O Power teve uma pausa mercadológica no meio dos anos 00, mas está se estruturando. Hoje tem a coisa do nicho do nicho... Assim que funciona, não tem uma coisa de massa.

Gustavo Maiato: O Aquaria fez um tributo ao Angra, gravando o clássico Carry On. Como foi essa experiência?

Alberto Kury: Sim, foi logo depois do falecimento do Andre Matos. Foi muito emocionante. Eu sou muito fã do Andre Matos. Sofri muito quando ele morreu, foi como perder um amigo.

Eu convivi pouco com ele, mas a proximidade artística foi grande. Para mim foi ótimo fazer esse tributo, foi uma forma de desabafar. Gostamos muito de fazer. Acho que ficou bem legal, teve a cantora Vanessa Lockhart também.

Gustavo Maiato: Teve uma história que o Andre Matos quase entrou no Aquaria... Como foi isso?

Alberto Kury: Tem uma certa verdade, houve conversas, mas nada muito concreto! Foi um devaneio!

Gustavo Maiato: Mesmo com a pandemia, já tem planejamento para o ano que vem?

Alberto Kury: Estamos lançando o disco. Não sabemos sobre possibilidade de show, mesmo no segundo semestre. Mas queremos nos preparar para shows, caso tenha condição.  Vamos observando a marcha dos acontecimentos. Só queremos fazer show quando a situação estiver mais resolvida mesmo.

Vamos começar também a pré-produção do próximo disco. Temos tempo e vamos adiantando o que der. Quando for a hora de show, estaremos prontos.

Gustavo Maiato. Falando sobre outros projetos. Você comentou sobre o Novalotus que apareceu quando o Aquaria estava em um hiato. Como surgiu a ideia de formar essa banda? Como você avalia os materiais lançados nesse outro projeto?

Alberto Kury: O Aquaria nunca terminou oficialmente. Ele se dissolveu quando o Bruno Agra, o baterista, foi morar fora. Não foi possível trabalhar nesse formato. Ele foi conquistar novas coisas. Então ficamos discutindo se seria legal fazer um disco novo com uma nova identidade.

Lançamos duas demos on-line e depois um EP. Chegamos a fazer alguns shows no Rio. A partir desse vaivém do Novalotus eu repensei minha carreira artística.

Eu estava um tempo sem gravar. Começamos então a falar de novo com a galera do Aquaria e isso consolidou a volta do Aquaria. Por que não voltar? Conversamos e a coisa foi se desenvolvendo. Estávamos inseguros, o Aquaria tem uma história. Nunca fomos de massa, mas éramos conhecidos, tinha um espaço.

Gustavo Maiato: Você também tocou em um cover de Beatles, certo?

Alberto Kury: Tocamos Beatles por muito tempo! Na Eleanor Band. Era algo em paralelo. Tem uma história bem bonita aí. A origem da banda cover de Beatles foi para pagar as gravações do Luxaeterna. A gente começou a levantar dinheiro aí. Queríamos gravar da melhor forma possível. A gente já adorava Beatles, então foi ótimo!

Essa banda de Beatles acabou dando muito certo, tocamos para caramba aqui no Rio! Éramos bem profissionais. Foi maravilhoso. Mergulhamos muito na obra de Lennon e McCartney. Se você ouvir algumas coisas do Luxaeterna, você vai ouvir um eco dos Beatles. Incorporamos isso de certa forma. Absorvemos a linguagem.

26 Jan 2021

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