Carlos Maltz é co-fundador e baterista da formação clássica dos Engenheiros do Hawaii. Ele tocará com seu ex-companheiro de banda, o guitarrista Augusto Licks, no dia 21 de abril no Bar Opinião, em Porto Alegre. Conversamos sobre esse show e fizemos um passeio pela carreira de Maltz, que você pode conferir abaixo.
Obrigado pela entrevista! Carlos, você vai se reunir com o Augusto Licks pela primeira vez em décadas para um show em Porto Alegre no dia 21 de abril. Como estão os ensaios? Deve ser curioso ensaiar cada um em uma cidade e depois só unir para ensaios conjuntos...
Eu toco essas músicas tem alguns anos, na verdade! Tenho elas quase que decoradas de trás para frente. Mas tocar com as pessoas é outra coisa. Nós não vamos ter muito tempo para ensaiarmos juntos com a banda. Eu e o Augusto Licks estamos nela. Vamos ver como será! Estou instigado. Será que existe mesmo esse espírito dos Engenheiros do Hawaii? Será que ele vai se manifestar?
O que você pode adiantar sobre as peças de bateria que os fãs vão poder conferir no dia do show? Alguma que remeta ao período do GLM?
A bateria que vou tocar será a mesma da capa do ‘Alívio Imediato’. Uma Premier do final dos anos 1980. Foi a única que sobrou de tudo que eu tinha! Fui vendendo tudo ao longo do tempo. Ela é inglesa, do começo dos anos 1980. É Engenheiros raiz! [risos]
Em entrevista ao Corredor 5, Humberto Gessinger deu a entender que uma barreira para se reunir com você e Licks é que ele gosta sempre de mudar os arranjos das canções originais. De sua parte, o que você acha de um show com o GLM completo fazendo alterações nos arranjos dos clássicos dos Engenheiros?
Não acho que tenha barreira nenhuma. É só querer mesmo. Essa é a única barreira. Se vai fazer os arranjos originais ou outros, ou uma parte original e outra mudando, isso são coisas que veríamos na hora. Não adianta ficar falando disso antes. Não há barreira nenhuma para reunir a banda É só querer.
Sabemos que os Engenheiros eram “outsiders” da cena do rock nacional e não se relacionavam de maneira estreita com as outras bandas famosas. Mesmo assim, imagino que você tenha encontrado alguns desses outros ícones da música seja em festivais, aeroportos ou bastidores de programas de TV. Você tem alguma história em comum com nomes como Cazuza, Renato Russo ou Herbert Vianna? Pode compartilhar alguma delas?
Tem uma história curiosa. Tínhamos uma rixa com os caras dos Titãs. Nem me lembro o motivo! Era alguma bobagem. Aí, estávamos indo fazer show em Curitiba. Paramos em São Paulo e quem entra? Os Titãs! [risos] Ninguém se falava, ficamos no mesmo hotel e ninguém se falou. Passou pouco tempo e fomos fazer outro show em Curitiba. Isso não acontecia frequentemente, voltarmos para fazer show no mesmo lugar tão rápido. Chegamos lá e quem estava no hotel? Os Titãs! A possibilidade matemática disso acontecer era muito pouca, né? Os caras estavam lá de novo! No mesmo hotel. Pensei: ‘Não acredito, esses caras estão aqui, vou tomar café bem cedo para não cruzar com ninguém’. Geralmente os músicos acordam mais tarde. Cheguei lá e só tinha uma pessoa tomando, que deve ter tido a mesma ideia que eu. Era o Charles Gavin! Não teve jeito, tive que sentar na mesa e conversar. Ficamos brotheres! Ele é muito gente boa!
Além de músico, você também é psicólogo e atua com astrologia e tarô. Como surgiu o interesse por essas áreas? O que há de comum ou de diferente entre elas e atuar na música?
Meu interesse na astrologia e psicologia é o autoconhecimento. Estudo Jung já tem muito tempo. É uma busca por mim mesmo. A consequência natural foi começar a atender os outros. Agora, pensando no que a astrologia tem em comum com a música, é o ritmo! Eu sou baterista e a astrologia tem o ritmo. É o ritmo com que Deus bate o tambor e nós dançamos aqui embaixo na Terra.
No álbum “Simples de Coração”, Augusto Licks foi substituído por Fernando Deluqui, que atuava no RPM. Quais memórias você tem desse disco e principalmente em relação a essa troca? Imagino que depois de tocar por anos com o Licks, tenha sido diferente trocar de guitarrista...
O Simples de Coração foi um disco totalmente diferente. Trabalhamos com um produtor americano. A banda mudou e já não era mais a banda; e sim, um bando de gente. Cada uma tirando para o seu lado. Fiquei um tempo com o Fernando Deluqui em Los Angeles, ficamos no mesmo quarto. Ele é ariano e bem roqueirão! Gente boa demais! Mas nessa época, a memória que ficou mais forte para mim foi o contato com o Greg Ladanyn. É um nome romeno. Meu contato com ele foi muito importante para mim. Ele me fez perceber o que tenho a acrescentar como baterista. Ele falava que eu era um ‘emotional drummer’, um baterista emocional.
Em 2001, você lançou o álbum solo “Farinha do Mesmo Saco”, que teve entre os destaques a participação de Humberto Gessinger em “Depois de Nós” e “Quase Uma Oração”. Como estava sua relação com o Gessinger nessa época e como surgiu essa ideia de convidá-lo para o disco?
Eu convidei o Humberto nesse meu disco solo! Nós nos dávamos bem, tanto que ele aceitou, né? [risos] Quando começamos os Engenheiros, não éramos brotheres entre nós. Não tinha nada a ver. Ninguém ia na casa um do outro. Mesma coisa com o Augusto Licks. Nossa relação pessoal sempre passou pela música. Nós somos personalidades fortes. Nós três, bem diferentes. Não era muito fácil a convivência. Na verdade, nem lembro detalhes de como estava minha relação com o Humberto naquela época!
Também temos a participação de Zé Ramalho em “Passos do Mundo”. Como foi tocar com o Zé Ramalho? Qual sua opinião geral sobre a obra dele?
O Zé Ramalho é um gênio total da música brasileira, né? Sou fã dele desde 1977, quando assisti a um show dele no Teatro Ipanema, no Rio. Ele se chamava Zé Ramalho da Paraíba. Até ele, eu não ouvia música em português. Achava tudo muito chato. Gostava de ouvir rock, como led Zeppelin e Pink Floyd. Passei a ouvir depois do Zé Ramalho. Eu ia gravar o disco e tinha essa música ‘Passos do Mundo’, que achava que tinha a ver com ele. Lembro que mandei uma carta para ele na época. Peguei a letra de ‘Vila do Sossego’, fiz umas variações e mandei para ele. Ele gostou! Veio e gravou”.
Sabemos que uma reunião do trio GLM hoje em dia seria um dos eventos mais impactantes da história do rock nacional de todos os tempos. Você tem uma avaliação de qual seria esse impacto? Muitos comparam com a reunião dos Titãs que acabou de acontecer e lotou estádios pelo Brasil...
Tenho batalhado por essa reunião do GLM desde antes da pandemia. No caso dos Titãs, eles eram uma grande banda dos anos 1980 e 1990, uma maior do que nós, inclusive, não só em termos de quantidade de integrantes, mas do tamanho que eles ocupavam no cenário do rock brasileiro. Eles são calcados em cima da energia punk rock. Já nosso lance era a música, os arranjos principalmente, toda a engenharia havaiana, a inteligência com que nós fazíamos aquilo. Acho que os Engenheiros é uma banda inteligente. O show era uma festa, uma congregação. Voltávamos para o palco cinco vezes! Sempre tivemos muitos fãs e bandas cover. Está impregnado no coração das pessoas do Brasil. Tem pai, filho e avô que vai. Homem, mulher, branco, preto, gay, direita e esquerda. Nesse momento, em que todos estão divididos, passar por cima das diferenças que existem entre nós seria um ato artístico da maior grandeza. Eu e o Augusto já estamos fazendo isso. Queremos dar para as pessoas esse ato de reunião. Esse exemplo de passar por cima desses muros e grades que estão sendo construídos entre as pessoas. Seria algo grandioso essa reunião, não só do ponto de vista musical, mas espiritual também.
Deixe uma mensagem final, por favor, para seus fãs e convide-os para o show do dia 21! Muito obrigado!
Quero deixar meu convite para vocês estarem com a gente. Eu sou co-fundador dos Engenheiros do Hawaii. Vou tocar em Porto Alegre com o Augusto Licks, no Bar Opinião. Não tocamos juntos há 30 anos! Será um acontecimento. Uma alegria participar disso. Espero que eu consiga segurar a emoção na hora e tocar para vocês!