23/12/2021 às 12:57 Entrevistas

Entrevista com Phil Pendergast (Khemmis)

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8min de leitura

Colhendo os frutos do lançamento do ótimo álbum “Deceiver”, os americanos do Khemmis continuam escrevendo o nome entre as grandes bandas de doom metal. Ao incorporar elementos mais rápidos e diversas influências no seu estilo, o grupo traz nova vida para esse cultuado subgênero.

Entrevistei o guitarrista e vocalista Phil Pendergast, que contou sobre influências, mitologia grega, seus guitarristas favoritos e muito mais! Boa leitura!

Gustavo Maiato: Como está sendo a reação dos fãs com o lançamento do novo álbum “Deceiver”? Está satisfeito com o resultado que a banda obteve?

Phil Pendergast: Honestamente, só de lançar o álbum para mim já foi ótimo! Todos na banda sentiram que alcançamos exatamente o que queríamos. Tanto em termos da música quanto da mensagem que queríamos passar.

Não me importei muito com como as pessoas reagiram. Tento não olhar muito o que sai na imprensa, mas já vi muitas críticas positivas. A Nuclear Blast disse que está vendendo bem. Estou muito feliz que as pessoas estejam ouvindo e tirando algo dele. Eu certamente tirei!


Gustavo Maiato: Falando sobre a mensagem por trás das músicas, são letras sombrias! Elas dialogam com esse período negro da pandemia. Você acha que a música pode ajudar as pessoas nesses tempos de dificuldade?

Phil Pendergast: Sempre tive uma relação emocional com a música. Para mim, as músicas que mais amo sempre estiveram comigo nos momentos em que mais precisei um ombro para chorar ou me ajudar quando estava com muita raiva de alguma coisa.

A música me deu um momento de catarse, me fez sentir vivo novamente quando precisei. Então, a música pode ser algo terapêutico para alguns. Não acho que todos precisem ter isso para extrair algo do álbum.

Posso me considerar feliz se as pessoas ouvirem o álbum e falarem que é fodão ou porque acharam os riffs de guitarra legais. Ou até mesmo se alguém considerar divertido ouvir. Mas as pessoas podem usar minhas músicas como uma ferramenta para trazer alívio aos problemas que elas enfrentam.

Gustavo Maiato: O formato de “Deceiver” é curioso, com apenas 6 longas músicas. Como surgiu essa ideia? Foi algo que veio naturalmente ao longo do processo de composição?

Phil Pendergast: Mais ou menos! Era algo que esperávamos. Esse é nosso 4º disco, temos o direito de compor uma música de mais de quatro minutos (risos)! A maioria das nossas músicas fica em torno de 7 minutos. Sabemos que seria assim. O motivo é porque sempre queremos escrever músicas que te levem em uma jornada. Que possa contar uma história com a letra e com a música.

Para isso acontecer, as músicas precisam ser longas. Precisam respirar e te levar nessa jornada, mas sem que você se sinta perdido no caminho ou que perceba que um trecho surgiu do nada, tipo: “O que está acontecendo? Essa música não faz sentido!”. Acho que essa é a razão pela qual nossas músicas são grandes.

Para esse álbum, e em todos os outros, sempre compusemos pensando no formato do LP. Ou seja, algo tipo 45 minutos. Sempre tentamos ter uma sequência nas músicas para que fique com o mesmo tamanho no lado A e no lado B, para ter uma fluidez. Depois da terceira música, dá para ter uma quebra, porque seria a hora de trocar o lado.

No final, gravamos oito músicas, mas não ia caber tudo. Queríamos entregar a versão que sentíssemos ser a mais completa. Então ficamos com músicas extras para o futuro!


Gustavo Maiato: As músicas “Shroud of Lethe” e “House of Cadmus” falam sobre mitologia grega. Como surgiu a ideia para compor sobre esse tema?

Phil Pendergast: É uma longa história! Eu já havia pensado no conceito e as letras das músicas antes de pensar o título delas. Percebi que, essencialmente, “Shroud of Lethe” é sobre a memória e como podemos ter lembranças erradas das coisas. Podemos lembrar de algo, mas não ter certeza de como aconteceu de fato.

Então, queria que essa música fosse sobre essa ideia da memória, essa sensação amarga de se segurar em uma memória errada. Precisamos ver a realidade e deixar essa ilusão ir embora. Quando percebi que o assunto seria esse, buscar um título foi desafiador. A mitologia grega tem esse rio chamado Lete, que está no submundo. Esse local é onde as almas vão para beber de suas águas e esquecer de suas vidas passadas.

Essa foi a metáfora perfeita para quando você quer se livrar de uma memória que está te perseguindo. Essa foi a inspiração para a música. Acho que foi a primeira música sobre mitologia grega que fizemos, então percebi que podia abordar o assunto novamente.

A arte da capa também tem isso. É um herói trágico da mitologia grega. Então surgiu essa ideia de trazer esses temas na medida do possível. A narrativa do álbum inteiro para mim me lembra a aventura de Dante no inferno. É outra ligação entre as músicas.

“Avernal Gate”, por exemplo, é a faixa de abertura... Literalmente abrindo os portões do inferno e o resto do álbum chega na sequência. A “House of Cadmus” tem sim essa ligação com a mitologia grega, porque essa linhagem da família de Cadmus aparece bastante na mitologia.

A história que queria trazer era sobre essa espécie de maldição de família que transcendeu gerações. Tem uns elementos de incesto também. As músicas não foram originalmente pensadas para ser sobre essa mitologia, porque o título só veio depois, mas acabou dando certo.


Gustavo Maiato: O nome da banda “Khemmis” também vem da mitologia..., mas dessa vez a mitologia egípcia! Acho que você realmente gosta de mitologias!

Phil Pendergast: Sim! Eu gosto de como as mitologias são universais. Sempre podemos aprender algo com esses mitos. Sociedades indígenas têm mitos da criação do universo e várias outras histórias que são na verdade uma sabedoria universal.

Os mitos não têm autoria também. Não tem um autor que escreveu os mitos da mitologia grega, por exemplo. As histórias são muito antigas. O que queremos fazer com o Khemmis é isso: não tem a ver especificamente conosco. Queremos pensar que escrevemos sobre algo que já existia antes, como os mitos. O nome da banda não significa muita coisa para a maioria das pessoas, mas tem essa história por trás. Acho isso legal! Soa misterioso!

Gustavo Maiato: Vocês tocam um estilo conhecido como doom metal. Uma vez eu li que a história do metal sempre foi assim: bandas surgindo e querendo tocar mais rápido. O doom, por outro lado, vai na direção oposta e apresenta músicas lentas. Qual sua opinião sobre a proposta sonora do doom?

Phil Pendergast: Eu nunca tinha pensado nisso, mas acho que você está certo. As versões mais extremas do doom metal são muito lentas! Mais do que tudo que ouvi! No nosso caso, também passamos por essa trajetória do metal que você falou. Começamos muito lentos, depois introduzimos elementos mais rápidos. O motivo foi simplesmente manter nossa música interessante para nós mesmos.

Dá para botar muitas partes de mid-tempo ou bem lentas até que tudo se torne monótono. Acho que tenho uma queda por bandas que têm esse lado emotivo do doom metal, mas que não sigam totalmente a cartilha do estilo. Gosto quando trazem influências do death, black ou metal clássico.

Não pensamos muito sobre a quão rápida ou lenta é nossa música. Mas precisamos ter certeza que o sentimento está lá, sempre apimentando a coisa para tornar interessante. O processo de composição pode ser inesperado! Do nada, uma música pode virar um black metal! Isso é divertido. Nós desafiamos as expectativas das pessoas sobre o que o doom metal pode ser.

Gustavo Maiato: Quais guitarristas dentro do doom metal você mais gosta?

Phil Pendergast: O Tony Iommi seria a resposta certa! Ele fez todos os riffs! Gosto muito do Matt Pike, do High on Fire. Inclusive estou com uma camisa deles agora! Amo também todos os famosos duetos de guitarra, como no Mercyful Fate, Judas Priest, Iron Maiden e Metallica. Você não pode apreciar essas bandas plenamente a não ser que preste atenção no que esses guitarristas fazem ao mesmo tempo.

Acho que nossa banda é uma continuação dessa tradição. Temos muitos elementos que não ficariam legais se não fosse a presença de duas guitarras. Minhas maiores inspirações vêm do rock clássico. Mais do que o próprio heavy metal. Sou um grande fã do Jimi Hendrix, David Gilmour. Eles tocam com um vocabulário próprio.

Sou fã do Glenn Tipton, do Judas Priest, pela mesma razão. O solo de guitarra dele em “Dreamer Deceiver” só podia vir dele! Eu aprecio quando a guitarra “fala” como se fosse uma voz humana. É algo memorável. Isso é o que me inspira mais. Tento botar esse espírito na banda. Não toco todos os solos, mas os que toco, tento fazer com que sejam memoráveis.

Gustavo Maiato: Qual dica você daria para um guitarrista que quer tocar com seu timbre, seu estilo?

Phil Pendergast: A coisa mais importante é pensar que você não precisa fazer de tudo. Não precisa saber sweep picking em mil BPMs! Toque com suas limitações. Se você pensar, são as limitações que fazem as pessoas serem interessantes. Isso se aplica aos guitarristas e cantores. Você precisa encontrar o que é único em você. Descobrir a parte em você que é mais fácil de você expressar.

No meu caso, não sou um guitarrista muito técnico, mas tenho um bom ouvido para melodias, ritmo e sentimentos. Ao abraçar essas coisas ao invés de gastar meu tempo praticando down picking ou palhetada híbrida, prefiro gastar tempo descobrindo novas formas de mostrar a personalidade de como toco, ainda que seja algo imperfeito.

Outro conselho é não ter medo das frequências médias. A guitarra sempre foi um instrumento que ocupou as frequências médias do espectro musical. Muitas pessoas que tocam metal em afinações mais graves resolvem aumentar o grave no amplificador, os tons médios ficam para trás. Mas se você olhar como configuro meu amplificador, ficará surpreso ao ver como o baixo, médios e agudos são configurados. Tudo precisa estar a serviço de ajudar seu estilo musical. Meus riffs não são com notas únicas, como o Black Sabbath, e sim baseados em acordes. Se você não tiver brilho no timbre, não vai ficar legal.

Então é melhor não adicionar muito ganho e aumentar os médios. Tudo isso contribui para uma sonoridade que as pessoas não associam ao metal, mas acho que o resultado fica com um timbre melhor, porque está limpo e mais entendível. Esses são meus conselhos!



Gustavo Maiato: Você conhece alguma banda ou artista aqui do Brasil?

Phil Pendergast: Todos nós somos muito fãs do Sepultura. O Max Cavalera é um excelente guitarrista. Dá para perceber um pouco da influência do Sepultura no nosso novo álbum, mas não tem uma parte específica.

Nosso baterista Zach Coleman teve a oportunidade de gravar o álbum de estreia do Go Ahead And Die, com o Max e seu filho. É legal ter essa relação com uma das famílias mais influentes e estimadas do metal.

Além disso, também sou fã dos Mutantes! Eu amo o som deles! Vi eles ao vivo em Seattle quando eu era adolescente. Nunca tinha ouvido antes e eles simplesmente me deixaram sem palavras! Eu achei maravilhoso! Pensei: “De onde será que eles vêm?”. Então descobri que a banda existia há mais de 40 anos.

23 Dez 2021

Entrevista com Phil Pendergast (Khemmis)

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